Operações Urbanas contribuem com elitização do espaço urbano em São Paulo

Centro da capital paulista perde comércio e tem aumento de edifícios residenciais de médio padrão, aponta a mais recente Nota Técnica do CEM.

Janaína Simões

As Operações Urbanas Consorciadas (OUCs), especialmente as realizadas nas regiões da Faria Lima e Água Espraiada, contribuíram para tornar ainda mais exclusivos os espaços já elitizados da cidade de São Paulo, situados mais ao sul e oeste do Centro. Em todas elas, a verticalização tomou espaço, sobretudo em detrimento das unidades horizontais de baixo padrão. Já a OUC Centro foi marcada pelo aumento dos imóveis de padrão médio, e perdeu edifícios comerciais. O crescimento de estoque residenciais nesses espaços foi mais significativo no período do que usualmente considerado, essencialmente centrado em imóveis comerciais. Estes são alguns destaques da mais nova Nota Técnica “Políticas do Urbano, Desigualdades e Planejamento”, produzida pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM-Cepid/Fapesp).

A análise desenvolvida por Eduardo Marques e Guilherme Minarelli, diretor e pesquisador junior do CEM, respectivamente, se baseou em dados fiscais de registro de propriedades imobiliárias na cidade de São Paulo, produzidos pela Secretaria da Fazenda Municipal (SF) da Prefeitura Municipal de São Paulo (PMSP) para fins de lançamento do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), e se referem ao período 2000-2020.

A Nota Técnica “Padrões de crescimento dos estoques nas Operações Urbanas Consorciadas, Município de São Paulo (2000/2020)” analisa o estoque de imóveis residenciais e comerciais nas OUCs, considerando volumes, tipos e padrões, em continuidade às Notas Técnicas anteriores publicadas pelo CEM (NTs 01, 04, 08 e 13), que podem ser consultadas aqui. As OUCs são reguladas pelo Plano Diretor de São Paulo e permitem flexibilizar limites estabelecidos pela lei de zoneamento vigente, mediante o pagamento de contrapartida financeira à Prefeitura.

De acordo com a NT 16, as OUCs representam cerca de 3,5% da área urbanizada da cidade e produziram intensa transformação do solo, sobretudo as Operações Faria Lima e Água Espraiada, com forte crescimento das tipologias verticais de alto e médio padrões, tanto comerciais como residenciais. As operações aumentaram a concentração de imóveis comerciais em relação ao total do estoque, tendendo a concentrar certos tipos de atividades em regiões relativamente pequenas. “Essa tendência parece ser contrária à busca pela aproximação casa-trabalho e à uma distribuição mais equilibrada das atividades de maior valor e relevância econômica no território e mais diversa em termos habitacionais”, aponta a NT.

Área de estudo - NT Operações Consorciadas
Área de estudo

O estudo analisa uma área de cerca de 31 km², sendo a Água Espraiada (AE) a maior delas, com cerca de 13,72 km², seguida a Faria Lima (FL) e a Centro (C) com cerca de 6,25 km² cada. O histórico de suas aprovações e implementações remonta pelo menos à década de 90, mas suas revisões no início dos anos 2000 ampliaram as atividades e a arrecadação. Em seu conjunto, essas OUCs geraram um acréscimo de mais de 54 mil unidades residenciais verticais e 21 mil unidades comerciais verticais, totalizando 9 milhões de m² construídos em cada uma dessas tipologias. “Isso aponta para a relevância da produção residencial nas OUCs, pouco destacada no debate, já que esta representou mais do que o dobro do crescimento de unidades comerciais, alcançando a mesma quantidade de m² construídos, pela maior área média dos imóveis comerciais”, destaca a NT.

Apesar disso, houve um crescimento mais intenso de unidades comerciais nas áreas das OUCs, o que promoveu aumento da concentração e da participação dessas regiões no total de imóveis dentro das áreas das tipologias comerciais na cidade. A exceção está na área da OUC Centro, que, apesar de ainda concentrar a maior parte dos imóveis comerciais, vem perdendo relevância, saindo de 13% para 10% do total da cidade. O crescimento da concentração dos comerciais ocorreu sobretudo na OUC FL que aumentou sua participação de 5% para 8%, e AE de 2% para 5%. Em menor medida, ocorreu também aumento da concentração na OUC Água Branca (AB), que passou de 1% para 2.5% do total de imóveis comerciais da cidade.

“Em relação à cidade, as regiões das OUCs passaram a concentrar maior número de imóveis de padrão alto, tanto residenciais, de 10% em 2000 para 14% em 2020, quanto comerciais, de 36% para 47%. No que diz respeito aos primeiros, a FL manteve sua participação em torno de 5%, mas a AE a superou saindo de 4% para 6% do total da cidade. Entre os comerciais, acentuando um processo de longo prazo, a forte concentração do estoque de alto padrão na FL e na AE aumentou ainda mais, passando de 14% para 20% e de 13% para 18%, respectivamente, entre 2000-2020”, detalha a NT.

A distribuição espacial, por tipo de imóvel

O mapeamento feito pelos pesquisadores identifica novidades, como um crescimento maior de prédios de alto padrão nas áreas externas, mas próximas às das OUCs FL e AE, e a influência das linhas de metrô, que parecem ser focos de atração de novos imóveis dessa tipologia, assim como a de médio padrão. Na primeira década, as OUCs FL e AE representaram 10% do incremento em unidades residenciais verticais de alto padrão na cidade. Na segunda década, a participação no incremento aumentou para 14%.

O crescimento do estoque dos prédios de médio padrão ocorreu nos mesmos espaços ou de maneira contígua à tipologia de alto padrão. Enquanto as de alto padrão tenderam a se concentrar ao redor das margens do rio Pinheiros, mais para a leste em direção ao Centro, nas regiões de Itaim, Moema, Vila Mariana, Jardins, Bela Vista e Consolação, em torno da avenida Paulista, e a oeste, para Pinheiros e Vila Leopoldina, as de médio padrão se expandiram para uma região mais distante do rio Pinheiros e mais próxima às linhas de transporte público, havendo também novas áreas de expansão, sobretudo para o sul, na direção de Campo Grande e Cidade Ademar, e leste, passando pelo Saúde, Ipiranga.

No caso dos prédios comerciais de alto padrão, o destaque fica para as regiões das OUCs FL e AE, onde se observa um crescimento de prédios comerciais voltados para empresas e serviços com padrão mais elevado, concentrando ainda mais o parque existente anteriormente na cidade. Entre 2000 e 2020, a região concentrou cerca de 40% do incremento desta tipologia, com crescimento voltado para as margens do rio Pinheiros em direção ao Sul e ao Norte, assim como em direção ao centro, na ligação com a região da avenida Paulista, entre os Jardins e a Bela Vista.

Já o crescimento dos prédios comerciais de médio padrão tendeu a se concentrar nas bordas mais a norte da OUC FL, em direção à Avenida Paulista, e na intersecção entre os dois setores principais da AE, onde o trecho que margeia o rio Pinheiros se conecta com o setor que adentra o território mais a leste. Ao mesmo tempo em que as atividades comerciais se concentram mais fortemente nas áreas mais à margem do rio em ambas as operações, a tipologia de médio padrão parece crescer mais próxima às faces norte das principais avenidas da região.

No caso dos prédios residenciais de padrão médio, o destaque fica para a área da OUC Centro, cujo crescimento mais expressivo se deu entre 2010 e 2020 e se concentrou na região da República e da Vila Buarque, em direção à oeste, assim como da Santa Cecília e Campos Elísios (que está fora do OUC). As regiões mais ao sul da Sé, em direção à Liberdade, e à Leste em direção ao Brás, e após o rio Tamanduateí e o Terminal Dom Pedro II, também tiveram crescimento com verticalização mais recente.

A NT “Padrões de crescimento dos estoques nas Operações Urbanas Consorciadas, Município de São Paulo (2000/2020)” pode ser acessada na íntegra aqui e é parte de um conjunto de estudos publicados pelo CEM que abordam aspectos do planejamento municipal, como o parque imobiliário, a mobilidade, a participação social e o orçamento. Essa sequência de trabalhos está orientada a informar os debates sobre a revisão do PDE em curso, bem como as discussões que serão promovidas pelo Fórum SP 21 realizado entre 21 de setembro e 1º de outubro, com o objetivo de analisar o planejamento urbano da cidade de São Paulo. O CEM foi um dos organizadores do evento.


Sobre o CEM:
Criado em 2000, com início das atividades em 2001, o Centro de Estudos da Metrópole (CEM) é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Cepid-Fapesp) e reúne cientistas de várias instituições para realizar pesquisa avançada, difusão do conhecimento e transferência de tecnologia em Ciências Sociais, investigando temáticas relacionadas a desigualdades e à formulação de políticas públicas nas metrópoles contemporâneas. Sediado na Faculdade de Filosofia, Letras, Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) e no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), o CEM é constituído por um grupo multidisciplinar, que inclui pesquisadores demógrafos, cientistas políticos, sociólogos, geógrafos, economistas e antropólogos.


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