Municípios com mais de 50 mil habitantes ampliaram em 94% os investimentos entre 2018 e 2022
O cenário fiscal dos municípios com mais de 50 mil habitantes no Brasil foi consideravelmente melhor em 2022 quando comparado a 2018, aponta a nova edição da série de Notas Técnicas Políticas Públicas, Cidades e Desigualdades do Centro de Estudos da Metrópole (CEM-Cepid/Fapesp). Apesar da crise econômica agravada com a pandemia da covid-19 e as consequências da guerra entre Rússia e Ucrânia, os dados de receitas e despesas dos municípios mostram uma condição positiva em termos de arrecadação de receitas, tanto próprias quanto transferidas, e uma redução de despesas obrigatórias como proporção da Receita Corrente Líquida, principalmente pessoal e encargos, o que permitiu aumentar os investimentos em 94%, na média dos municípios analisados, incluindo as capitais. No caso de cidades com 50 mil a 100 mil habitantes, o crescimento foi ainda maior, de 134%.
No entanto, há sinais de que essa situação pode estar em risco neste ano. A receita do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) caiu 8,1% nos quatro primeiros meses do ano comparados ao mesmo período de 2022. Também existem pressões para recomposição salarial do funcionalismo e há muitas dúvidas sobre como se desenvolverá a atividade econômica brasileira em 2023. Este alerta é dado por Ursula Peres e Fábio Pereira dos Santos, pesquisadores do CEM, na 21ª Nota Técnica “Panorama das finanças municipais: análise das capitais e municípios com mais de 50 mil habitantes - 2018/2022”.
O estudo analisa quase 600 municípios brasileiros - aqueles com mais de 50 mil habitantes - que dispunham dos dados sobre Receita Corrente Líquida (RCL); despesas por Funções; e despesas por Grupos de Natureza da Despesa (GND) na base de dados do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi) do Ministério da Fazenda, até março deste ano, para os exercícios de 2018 e 2022.
De acordo com o estudo, o crescimento real da Receita Corrente Líquida (RCL) dos municípios analisados, entre 2018 e 2022, foi de 24% - saiu de R$ 468,9 bilhões para R$ 582,2 bilhões. Um dos fatores responsáveis por esse aumento foi a maior arrecadação de Imposto Sobre Serviços (ISS), que se elevou em 28% no conjunto dos municípios com mais de 50 mil habitantes.
Um dos impactos positivos imediatos dessa performance foi a melhoria na nota CAPAG (Capacidade de Pagamento), da STN. Uma boa nota CAPAG permite às prefeituras contratar operações de crédito avalizadas pela União. Houve um aumento geral da classificação A e B no período.Com isso, “os recursos provenientes de operação de crédito aumentaram de R$ 6,3 para R$ 11,3 bilhões passando de 0,7% para 1% da receita total dos municípios com registros no Siconfi em 2022”, destacam os pesquisadores na NT.
O que explica o cenário positivo
Um dos eventos que explica o cenário positivo é o socorro fiscal federal concedido durante a pandemia. O aumento do preço de algumas commodities, em especial combustíveis e energia, além da elevação da inflação em 2021, também ajudaram porque levaram a um incremento da arrecadação própria e de recursos proveniente de transferências via fundos de participação para estados e municípios.
Já pelo lado das despesas houve redução relativa dos gastos municipais com pessoal quando comparada com o crescimento das receitas, o que foi impulsionado em grande parte pelas restrições impostas por legislação federal durante a pandemia e pela inflação mais elevada em 2021. Estudos recentes indicam um incremento menor de servidores no nível local, acompanhado por um aumento de despesas com serviços de terceiros.
Outro elemento que contribui para a melhoria da situação fiscal dos municípios foi a redução de despesas previdenciárias, especialmente nas capitais, a partir da implementação de reformas locais. “Com ganhos de receitas e redução de despesas obrigatórias, os municípios tiveram recursos para investimentos e aumentaram seu saldo de caixa”, apontam os pesquisadores.
Investimentos em infraestrutura cresceram no período
A NT analisa as despesas do ponto de vista das categorias econômicas e das funções. No primeiro caso, as categorias foram organizadas por grupos de natureza da despesa (GND). Os indicadores mostram que o volume principal de gastos dos municípios em 2022 foi com o grupo Pessoal e Encargos Sociais, como esperado.
O crescimento real da despesa de pessoal entre os municípios analisados teve média de 10%. No entanto, essa variação foi significativamente menor que o crescimento da Receita Corrente Líquida (RCL) no período avaliado. Houve uma redução na participação do gasto com pessoal em relação à RCL de 51,4% para 45,5%. Por outro lado, houve um crescimento real de 94% dos investimentos e inversões financeiras entre 2018 e 2022.
Existem diversos condicionantes para os gastos por funções orçamentárias. Parte expressiva é pré-definida constitucionalmente, o que fica fora da disputa da arena orçamentária - caso das áreas de educação e saúde. Existem, ainda, as despesas que não podem deixar de ser pagas, como a previdência social e encargos especiais.
Considerando os gastos que não se enquadram nessas categorias, os pesquisadores verificaram um crescimento mais expressivo das áreas de infraestrutura urbana em 2022 na comparação com o exercício de 2018. Em 2022, as áreas de urbanismo e transporte cresceram bem acima das demais funções, alcançando uma variação de 30% e 58%, respectivamente, considerando-se o total dos 597 municípios selecionados.
A Nota CAPAG e o cenário futuro
Um dos impactos da evolução positiva das finanças dos municípios foi o aumento das notas CAPAG A e B. Para o cálculo, considera-se o endividamento, a poupança corrente e o índice de liquidez dos municípios, diagnóstico da saúde fiscal e condição de aval federal para a contratação de endividamento. A partir dessa análise, são definidas notas para cada um dos três itens avaliados e a média é classificada como A, B e C, sendo que é necessário ter nota A ou B para ser elegível à contratação de empréstimo. Segundo a STN, em todo o país, o número de municípios com notas CAPAG A e B subiu para 3.329 municípios aptos a pegar empréstimos com garantia da União em 2022, comparados a 2.535 do ano anterior e 1.314 em 2018.
A Nota alerta que a situação positiva descrita pode mudar, a depender da evolução da atividade econômica nacional e de medidas em discussão no Congresso Nacional, como a Reforma Tributária. São fatores que impactam diretamente as receitas mais importantes para os municípios, como a quota-parte do ICMS, o ISS e o Fundo de Participação dos Municípios (FPM). A despesa de pessoal, por outro lado, pode voltar a crescer em razão de eventuais recomposições salariais ou da necessidade de novas contratações para repor perda de servidores.
Para consultar a Nota Técnica “Panorama das finanças municipais: análise das capitais e municípios com mais de 50 mil habitantes - 2018/2022” na íntegra, clique aqui.
Sobre o CEM:
Criado em 2000, com início das atividades em 2001, o Centro de Estudos da Metrópole (CEM) é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Cepid-Fapesp) e reúne cientistas de várias instituições para realizar pesquisa avançada, difusão do conhecimento e transferência de tecnologia em Ciências Sociais, investigando temáticas relacionadas a desigualdades e à formulação de políticas públicas nas metrópoles contemporâneas. Sediado na Faculdade de Filosofia, Letras, Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) e no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), o CEM é constituído por um grupo multidisciplinar, que inclui pesquisadores demógrafos, cientistas políticos, sociólogos, geógrafos, economistas e antropólogos.
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